terça-feira, 15 de janeiro de 2019


Essa admirável, flexível, tão modesta, capacidade de se abraçarem de costas, onde foram buscá-la, ó filhos do bom Deus?
Nem Friedrich Ludwig Jahn, o romântico pai da ginástica patriótica, ousou pretender mais que uma Alemanha em espargata,
ao passo que vós, poéticos burgueses de todas as liberdades, que emanam da cerveja ou de consciências dominicais,
quereis impor-nos desportos impossíveis, como a amizade em toque de estafeta e a natação dessincronizada.

Parada ideal dos indivíduos em massa, mural renascentista e arte povera, procissão da fé agnóstica ou herética,
eis-vos pelas ruas, pelos jornais, muitos e um só, em solidariedade multidireccional.
Aparentemente, é uma evidência colectiva que essa trompete de pistões ferrugentos é bisneta de Bach por aborto espontâneo,
e que ou bem que o velho mestre se revê nessa estúrdia ou não há que hesitar em chamá-lo à pedra, a ver se tem sentimentos pelos arbustos.

Eu, que andava para trás com o olhar no tempo e um ponto de interrogação tatuado na nuca,
embati num murete e acho-me parado — a morte marca passo neste sítio inexacto,
atoleiro de andores demasiado leves para a ciência da guerra, pirómanos basbaques e fogos de artifício.
Mas, entretanto, leio; entretanto, creio. Nada me demove de sofrer. Um velho rebentando de alegria.

Miguel Martins
15/01/19

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