Fui precocemente criança
(muitos nunca aqui chegam
ou demoram décadas).
Cedo comecei a chapinhar, dissimuladamente,
por sobre:
manadas de cavalos (leia-se,
a natureza);
campos de batalha (leia-se,
a política);
ocasos (leia-se,
a poesia).
Com pezinhos de lã, beberricava licores,
surripiava dentaduras na venda do mudo
e o mudo era toda a minha progénie,
toda a minha raison d’être,
se me é perdoado o atavismo.
A criança é o pirómano à solta,
antes e depois do incêndio que não chega a lavrar,
o ínfimo, nevrótico, premeditado corte da folha de papel
no sabugo do globo terrestre,
na sua alma mais tenra.
E — pasmem — tudo isso nasce da ternura,
sim,
como abóbora da terra,
como a cabeça de Pablo
Diego José Francisco de Paula Juan Nepomuceno
María de los Remedios
Cipriano de la Santísima Trinidad
Ruiz
y
Picasso — enorme amor instável de semeador do tempo —
da cona
(nascente do sangue)
da sua confiada mãe.
Miguel Martins
07/12/21
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