sexta-feira, 12 de outubro de 2018


Que todos os lugares onde sorrimos permaneçam desertos
até que haja outro amor assim para visitá-los.
Improfanados por vozes sem o naufrágio absoluto
que há por dentro de cada segundo da infância
e não a deixa esquecer a água limpa, a correnteza
que a leva ao encontro da montanha inexplicável
de que todos nascemos, sem importar o depois.
Que as nossas vozes quase silenciosas permaneçam gravadas
nas pedras que vão mudando de lugar
e que as pequenas e grandes convulsões do mundo
saibam lançá-las ao caminho de quem mais precise,
de quem melhor as saiba ouvir.
Que uma multidão de bichos cirande a ténue maravilha
do que seremos sempre, a arrepio do tempo,
no fio do horizonte que cintila nos olhos mais sedentos
e os faz partir à descoberta de areias e gelos e plantas,
a mais pequena das quais há-de ter nosso nome,
o nome que partilharíamos se fosse este o lugar
e não o que nos aguarda depois do breve incêndio.

Miguel Martins
(inédito)

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