É uma aventura surrealista, uma joint venture dos partisans e escritores portugueses Filipe Homem Fonseca e Miguel Martins. “Ferro em Brasa”, a mais recente edição da Antígona é a obra necessária para este Verão no panorama literário português.
Descrito como um “linguadão dos antigos, pré-pandemia, nas beiças de Alfred Jarry”, apresenta-se como uma novela que poderia ter sido escrita por Homero e Camões “se tivessem menos génio e uma Famel” - e, dizemos nós, cigarros, maços em catadupa, para fumar.
Nesta “quase-odisseia” de um fumador, existe um mundo entre o nonsense e o onírico, uma sinfonia absurdamente contemporânea, num texto desorganizado, composto por secções que nem sempre dialogam harmoniosamente umas com as outras. Ora prosa escorreita, ora aforismos da vida quotidiana e um índice onomástico pelo caminho. As epígrafes das oito partes que compõem o livro também saltam à vista. Podemos escolher a de Miguel Torga: “Nem tudo é lei da vida ou lei da morte. / Há limbos onde o homem desconhece / Esse dilema hostil”.
“Ferro em Brasa” não será porventura uma leitura de praia. Pode agigantar-se como obra literária de difícil acesso e por vezes o caminho escolhido, referencial e auto-referencial, poderá impossibilitar a leitura dos mais desprevenidos. Em todo o caso, é um livro que fazia falta em Portugal.
Pretensioso quanto baste, ambicioso o necessário para estes dois autores se confirmarem, uma vez mais, vozes pujantes de uma cena literária que não se coaduna com as convenções e as regras da lavoura de quem escreve. Por todas essas razões, tem a capacidade de nos desinquietar, relembrando-nos de como no meio do deserto ainda existem oásis para sobrevivermos.
Ferro em Brasa. De Filipe Homem Fonseca e Miguel Martins (ed. Antígona)
https://onovo.pt/cultura/uma-joint-venture-de-partisans-FX1617474
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