A JANELA ESCANCAROU-SE
Ainda não há luz no céu. Fumo
no ar. Lá fora, sobre a gravilha,
uma figura.
Irreconhecível. Envolta em bruma
e penumbra.
Bate na madeira negra e rachada
da tua porta.
E, se perguntares o nome de quem está
a incomodar-te em casa, uma voz dirá:
Aquela que expulsaste da tua vida
como lastro inútil.
Aquela que despejaste
como água de lavar pratos.
Que permitiste que secasse
como um lilás sob o calor
do meio-dia.
Que está sempre a morrer. Sempre a regressar.
Chamo-me verdade.
Nada me pára: nem a madeira
da tua porta. Nem a porta do teu quarto.
Nem a pele da tua carne. Nem
o telhado de osso sobre o teu cérebro.
Vou entrar.
Como uma alvorada.
Como um dia cuja chegada
nada consegue evitar.
Günter Kunert
(versão: Miguel Martins)
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