Ao centésimo mês do
ano da tristeza,
entraste-me no quarto
como um desenho vivo
e, por mais um
decénio, deitada sobre a mesa,
descreveste as
montanhas do nosso paraíso.
Um quarteto de cordas
vibrava-te na pele
e de pétalas soltas
recompunham-se rosas,
quatro lábios abertos
arfando num tropel,
que salivavam loucos,
sobre todas as coisas:
os poemas incautos de
morrer às escondidas
sob o sol destas ruas
emporcadas de gente,
e os nossos idílios
de toalha estendida
sobre a relva que aguarda
esverdear de repente.
E, nesse teu fantasma,
renasceram-me os olhos,
e, nesse teu regresso,
eu voltei a ter sangue
para, logo em seguida,
expirar sobre os escolhos
do mar demasiado em
que vivi exangue.
Mas uma luz imensa
atravessou então,
como um diaporama
musicado por risos
- oh sublime memória
da nossa canção -,
as montanhas mais
belas do nosso paraíso.
Tudo o mais se
eclipsou numa vaga de vento
e, por estranho que
fosse, adormeci em paz,
Como se o tempo todo
fosse só um momento.
E, neste sono eterno,
sou de novo rapaz.
Miguel Martins
02/03/17
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